Sumário
Toggle1. Introdução.
A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou, sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.153), um importante entendimento para o sistema jurídico brasileiro: os honorários advocatícios de sucumbência, apesar de terem natureza alimentar, não podem ser equiparados a prestações alimentícias para fins de penhora de salários ou valores depositados em poupança até o limite de 40 salários mínimos.
A decisão tem como base o artigo 833, §2º, do Código de Processo Civil (CPC) e traz reflexos significativos para advogados, profissionais liberais e o público em geral.
2. A Decisão da Corte.
A decisão foi tomada por maioria de votos no julgamento do Recurso Especial (REsp) 1.954.380 e foi relatada pelo ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. O colegiado estabeleceu que, embora os honorários sucumbenciais sejam considerados verba de natureza alimentar, essa classificação não se confunde com a prestação alimentícia. Essa distinção, segundo o relator, é “sutil, mas crucial”.
O ponto central da análise foi a diferenciação entre “natureza alimentar” e “prestação alimentícia”, conceitos que, embora correlatos, têm significados jurídicos distintos.
A prestação alimentícia é considerada uma espécie do gênero verba alimentar, estando diretamente vinculada à necessidade de garantir a sobrevivência e a dignidade do beneficiário em curto prazo, como nas pensões alimentícias.
3. Diferenciação entre Natureza Alimentar e Prestação Alimentícia.
Para o ministro Villas Bôas Cueva, as prestações alimentícias decorrem geralmente de obrigações periódicas e baseiam-se no princípio da solidariedade entre membros de um grupo familiar. Essas prestações também podem resultar de atos ilícitos ou decisões judiciais, como no caso de indenizações.
No entanto, os honorários sucumbenciais são frutos do exercício profissional do advogado, muitas vezes pagos à sociedade de advogados, e não diretamente à pessoa física. Tal distinção impede que os honorários sejam tratados com os mesmos privilégios legais reservados às prestações alimentícias, evitando que a exceção à impenhorabilidade se transforme em regra.
“Estender essa prerrogativa a honorários advocatícios, ou mesmo a outras categorias profissionais, abriria margem para penhorar qualquer verba relacionada ao trabalho, enfraquecendo o sistema de proteção aos devedores que realmente necessitam do benefício para garantir sua subsistência e a de seus dependentes”, argumentou o relator.
4. Reflexos Práticos da Decisão.
A tese firmada traz segurança jurídica para casos semelhantes que aguardavam julgamento, além de orientar futuras decisões sobre a possibilidade de penhora de valores recebidos a título de honorários advocatícios. A Corte reafirmou que os honorários de sucumbência não estão previstos nas exceções de impenhorabilidade tratadas no artigo 833, §2º, do CPC.
Apesar disso, o STJ não descartou totalmente a possibilidade de penhora de salários ou poupanças em casos excepcionais. O ministro destacou que, em situações concretas, poderá ser admitida a penhora parcial de valores, desde que preservado um percentual suficiente para proteger a dignidade do devedor e sua família.
5. Impacto no Exercício da Advocacia.
A decisão reconhece que os advogados, além dos honorários de sucumbência, possuem outras fontes de remuneração, como os honorários contratuais, o que amplia a análise econômica da atividade jurídica.
Também foi lembrado que as sociedades de advogados, muitas vezes responsáveis por receber as verbas sucumbenciais, funcionam como pessoas jurídicas, o que reforça a natureza distinta desse crédito em relação às prestações alimentícias.
6. Conclusão.
A fixação da tese pela Corte Especial do STJ no Tema 1.153 estabelece um marco para a interpretação da impenhorabilidade de salários e poupanças frente aos honorários advocatícios de sucumbência.
Ao fazer a distinção entre natureza alimentar e prestação alimentícia, o tribunal preserva a essência do sistema jurídico, que prioriza a dignidade e a sobrevivência dos credores de alimentos.
Com essa decisão, o STJ evita a banalização das exceções à regra da impenhorabilidade, garantindo que sejam aplicadas apenas a casos realmente excepcionais.
Essa medida contribui para fortalecer o equilíbrio entre o direito do credor à satisfação de seus créditos e a proteção legal conferida ao patrimônio mínimo necessário para a sobrevivência do devedor e de sua família.