Sumário
Toggle1. Entenda como o Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu sobre o marco prescricional em caso de dano moral decorrente de transtornos psicológicos – A Complexidade da Prescrição em Ações de Dano Moral no Direito Trabalhista.

No cenário jurídico brasileiro, a prescrição é um tema que frequentemente gera debates acalorados, especialmente quando envolve ações de dano moral decorrentes de transtornos psicológicos ou psiquiátricos.
A aplicação desse instituto no âmbito trabalhista exige uma análise cuidadosa, pois está diretamente ligada à proteção dos direitos fundamentais do trabalhador e à segurança jurídica das relações empregatícias.
O caso julgado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) sob o processo nº TST-Ag-AIRR-368-77.2019.5.19.0005 ,é um exemplo emblemático dessa complexidade, ao discutir o marco inicial da prescrição em uma ação de indenização por dano moral movida por um trabalhador que desenvolveu transtornos psicológicos após um assalto ocorrido em 2009.
O caso em questão não apenas traz à tona a discussão sobre os prazos prescricionais previstos no artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal, mas também evidencia os desafios enfrentados pelo Judiciário ao lidar com situações que envolvem a saúde mental do trabalhador.
Transtornos como o estresse pós-traumático não seguem uma linha temporal clara, muitas vezes demandando anos de tratamento e acompanhamento médico.
Diante disso, a pergunta que se impõe é: quando começa a contar o prazo prescricional em casos como esse? A resposta a essa questão não é meramente técnica, mas carrega implicações profundas para a justiça e a equidade nas relações de trabalho.
Neste artigo, analisaremos os principais aspectos jurídicos do caso, explorando os fundamentos legais e jurisprudenciais que embasaram a decisão do TST.
Além disso, discutiremos como a Corte equilibrou a aplicação da prescrição com a necessidade de proteger os direitos do trabalhador, garantindo que a justiça fosse feita de forma humanizada e contextualizada.
Ao final, espera-se que o leitor compreenda não apenas os detalhes do caso, mas também a importância de uma interpretação jurídica que leve em consideração as particularidades de cada situação, especialmente quando envolve a saúde mental e a dignidade do trabalhador.
2. O Caso em Análise: Contexto e Questões Jurídicas.

O processo em questão envolve um trabalhador que, após sofrer um assalto em 2009, desenvolveu transtornos psicológicos e psiquiátricos, diagnosticados como estresse pós-traumático.
O empregado afastou-se do trabalho por diversos períodos, recebendo auxílio-doença acidentário e auxílio-doença comum. Em 2019, dez anos após o evento traumático, ele ajuizou uma ação trabalhista pleiteando indenização por dano moral.
A questão central do caso é a prescrição quinquenal prevista no artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal, que estabelece um prazo de cinco anos para a reclamação de créditos trabalhistas durante a vigência do contrato de trabalho.
A empresa alegou que o prazo prescricional começou a correr em 2009, data do assalto, e que, portanto, a ação estaria prescrita ao ser proposta em 2019.
No entanto, o TST entendeu que o marco inicial da prescrição não poderia ser o evento traumático em si, mas sim o momento em que o trabalhador teve ciência inequívoca da real extensão do dano sofrido.
Esse entendimento está alinhado com a jurisprudência do TST e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reconhece a complexidade de transtornos psicológicos e psiquiátricos, os quais podem demandar anos para serem diagnosticados e tratados.
3. A Prescrição no Direito Trabalhista: Fundamentos Legais e Jurisprudenciais.

A prescrição é um instituto jurídico que visa garantir a segurança das relações jurídicas, estabelecendo um prazo para o exercício de determinados direitos. No âmbito trabalhista, o artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal estabelece que:
“É assegurado aos trabalhadores, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: […] XXIX – ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho.”
No caso analisado, o TST aplicou esse dispositivo de forma a considerar as particularidades dos transtornos psicológicos.
A Corte entendeu que, em casos de doenças ocupacionais ou transtornos mentais, o marco inicial da prescrição não pode ser rígido, devendo-se considerar o momento em que o trabalhador teve plena ciência da extensão do dano. Esse entendimento está em consonância com a Súmula 278 do STJ, que estabelece:
“Nas ações indenizatórias por dano moral ou material, o termo inicial da prescrição é o da ciência inequívoca do dano e de sua autoria.”
4. A Decisão do TST: Análise dos Fundamentos.

O TST, ao negar provimento ao agravo interno interposto pela empresa, destacou que o trabalhador ainda sofria com as sequelas psicológicas do evento traumático ocorrido em 2009.
A Corte considerou que os sucessivos afastamentos por auxílio-doença e auxílio-doença acidentário demonstravam a continuidade dos transtornos, o que impossibilitava a fixação do marco prescricional na data do assalto.
Além disso, o TST ressaltou que a questão não apresentava transcendência jurídica ou política, uma vez que não havia contrariedade a súmulas, orientações jurisprudenciais ou precedentes obrigatórios.
A decisão foi fundamentada no artigo 896-A da CLT, que estabelece os critérios para o reconhecimento da transcendência em recursos de revista.
5. Conclusão: A Proteção ao Trabalhador e a Humanização do Direito Trabalhista.

O caso analisado sob o processo nº TST-Ag-AIRR-368-77.2019.5.19.0005, ilustra a complexidade de situações que envolvem transtornos psicológicos e psiquiátricos no ambiente de trabalho, destacando a necessidade de uma interpretação jurídica que vá além da mera aplicação técnica das normas.
A decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) ao negar a prescrição da ação de dano moral demonstra um alinhamento com os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da proteção ao trabalho, previstos no artigo 1º, III, e no artigo 7º da Constituição Federal.
Ao considerar o ajuizamento da ação como marco inicial da prescrição, o TST reconheceu que transtornos psicológicos, como o estresse pós-traumático, não seguem uma linha temporal clara e previsível. Essas condições demandam tratamento contínuo e, muitas vezes, prolongado, o que torna inviável exigir do trabalhador o ajuizamento imediato da ação. Essa interpretação humanizada reflete o entendimento de que o direito não pode ser aplicado de forma rígida e descontextualizada, especialmente quando envolve a saúde mental do trabalhador.
Além disso, a decisão reforça a importância da jurisprudência consolidada, como a Súmula 278 do STJ, que estabelece o marco prescricional a partir da ciência inequívoca do dano. Esse entendimento é fundamental para garantir que os trabalhadores tenham acesso à justiça de forma efetiva, sem que sejam penalizados por questões que fogem ao seu controle, como a complexidade do diagnóstico e tratamento de transtornos psicológicos.
Por fim, o caso serve como um alerta para empresas e empregadores sobre a necessidade de adotar medidas preventivas e de apoio aos trabalhadores que passam por situações traumáticas no ambiente de trabalho.
A saúde mental não pode ser negligenciada, e o direito trabalhista deve ser um instrumento de proteção e reparação, garantindo que os trabalhadores sejam tratados com a dignidade e o respeito que merecem.
A decisão do TST, portanto, não apenas resolve uma controvérsia jurídica específica, mas também reforça o papel do direito como ferramenta de transformação social, capaz de equilibrar a segurança jurídica com a justiça e a humanização das relações de trabalho.