Sumário
Toggle1.INTRODUÇÃO.
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu nesta quinta-feira (9) um importante caso relacionado ao recurso cabível em pedidos de extensão de falência a sócios de empresas em processo falimentar.
O julgamento do Recurso Especial nº 2135344 – RS, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, trouxe discussões sobre a natureza jurídica do incidente processual, a aplicação do princípio da fungibilidade recursal e os limites de responsabilidade dos sócios de empresas falidas.
2. O CASO.
O processo teve origem em 2016, quando a G S – Negócios Imobiliários LTDA, recorrente, apresentou petição nos autos da falência de Placem – Planejamento e Construções de Centros Comerciais LTDA, requerendo a extensão dos efeitos da falência ao sócio Laerte Wanderley Sopper.
A empresa argumentou que havia indícios de irregularidades graves, como simulação de negócios e blindagem patrimonial, que justificariam a responsabilização do sócio pelas dívidas da massa falida.
O pedido foi inicialmente recebido pelo juízo de primeiro grau como incidente processual. No entanto, durante o trâmite, ocorreram mudanças na classificação do procedimento, gerando dúvidas sobre o recurso cabível contra a decisão de mérito.
Em 2022, a decisão judicial de improcedência ao pedido foi tratada como “sentença”, levando a G S a interpor recurso de apelação, posteriormente rejeitado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), que entendeu ser cabível agravo de instrumento.
3. O ENTENDIMENTO DO STJ.
A Ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, esclareceu que o ponto central da controvérsia era determinar se o ato judicial de primeiro grau, que indeferiu o pedido de extensão da falência, deveria ser desafiado por apelação ou agravo de instrumento.
O voto destacou que, embora a extensão dos efeitos da falência guarde semelhança com o incidente de desconsideração da personalidade jurídica – para o qual a legislação prevê o agravo de instrumento como recurso cabível –, no caso específico, houve dúvidas objetivas geradas pela imprecisão técnica do ato judicial.
A ministra apontou que o juízo de origem denominou o pronunciamento como “sentença” e a demanda como “ação de responsabilidade”, induzindo a parte recorrente a entender que seria cabível o recurso de apelação. Além disso, a própria defesa do recorrido utilizou a terminologia de “contestação”, reforçando a incerteza sobre a classificação processual.
“Quando a dúvida objetiva decorre da imprecisão do ato judicial, como ocorreu no presente caso, a aplicação do princípio da fungibilidade recursal é plenamente autorizada, afastando-se o erro grosseiro”, afirmou a ministra no voto.
4. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE E DECISÃO FINAL.
O princípio da fungibilidade recursal, aplicado na decisão, permite que o recurso interposto erroneamente seja aproveitado, desde que a escolha equivocada não decorra de negligência da parte e que não haja prejuízo à outra parte ou ao devido processo legal.
Com base nesse entendimento, a Terceira Turma do STJ deu provimento ao recurso especial, anulando o acórdão do TJRS e determinando que o recurso interposto pela G S seja processado.
A decisão foi fundamentada no compromisso com a primazia do julgamento de mérito e na busca pela segurança jurídica no tratamento de incidentes processuais relacionados à responsabilidade de sócios em processos falimentares.
5. IMPLICAÇÕES DA DECISÃO.
O julgamento reforça o entendimento do STJ sobre a responsabilidade de sócios em processos de falência e as regras para o manejo de recursos em incidentes de desconsideração da personalidade jurídica. Além disso, destaca a importância de evitar imprecisões técnicas que possam gerar insegurança jurídica e afetar o direito ao contraditório e à ampla defesa.
A decisão também consolida o papel do princípio da fungibilidade como ferramenta de correção de equívocos formais, promovendo a celeridade e a efetividade do processo judicial.
Este caso serve de alerta para operadores do Direito quanto à necessidade de clareza na redação de decisões judiciais e no enquadramento processual, especialmente em matérias tão sensíveis quanto a extensão de falências.
A decisão deve impactar futuros litígios envolvendo a extensão de falências e a responsabilidade patrimonial de sócios, sendo um marco no debate sobre a interpretação da legislação processual e falimentar no Brasil.