Sumário
ToggleIntrodução.
A tutela de urgência é uma ferramenta crucial no âmbito do Direito Civil e Processo Civil, destinada a assegurar a efetividade da prestação jurisdicional em situações emergenciais.
Seu papel é proporcionar a proteção imediata de direitos ameaçados ou violados, evitando prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação.
Este artigo busca explorar a importância, fundamentos legais e requisitos da tutela de urgência, destacando sua aplicação prática no contexto do Direito Civil e Processo civil.
1. Conceito e Natureza Jurídica.
A tutela de urgência é uma medida de caráter provisório concedida pelo Poder Judiciário para resguardar direitos fundamentais que estejam sob risco iminente.
A tutela provisória por ser conhecida como de urgência ou evidência. Desta forma, conceitua-se a tutela provisória como gênero, na qual existem duas espécies, que são a tutela de urgência e a tutela de evidência.
Já a tutela de urgência, divide-se em tutela de urgência cautelar e antecipatória; A principal distinção entre essas tutelas é que na antecipatória se busca assegurar o direito da parte antes do fim do processo, e na cautelar, pretende-se resguardar o resultado prático do processo, em decorrência do perecimento do direito, ou do bem discutido até o trânsito julgado da ação.
Ademais, a tutela de urgência poderá se incidental (durante o processo) ou antecedente (na petição inicial). Hoje em dia, no atual Código de Processo Civil, tudo é pleiteado no mesmo processo, diferentemente do que ocorria nos processos cautelares na vigência do antigo Código de Processo Civil.
O procedimento do pedido incidental é muito simples, basta apresentar petição apontando os requisitos e requerendo a urgência (CPC, artigo 295).
O juiz se entender pertinente, poderá determinar a concessão das medidas que considerar adequadas para efetivação da tutela provisória, observando, no que couber, as normas de cumprimento provisório de sentença (CPC, artigo 297, § único).
Caso concedida, negada, modificada ou revogada a tutela provisória, o juiz deverá motivar seu convencimento de modo claro e preciso (CPC, artigo 298).
Por fim, a tutela incidental deverá ser pleiteada ao Juízo da causa, ou ao Juiz competente quando for antecedente (CPC, artigo 299). Agora se a competência for do tribunal, o pedido deverá ser realizado diretamente no respectivo tribunal.
2. Fundamentos Legais.
A base legal para a tutela de urgência está disposta no Código de Processo Civil (CPC), notadamente nos artigos 300 a 310.
O artigo 300, por exemplo, estabelece os requisitos gerais para a concessão da tutela de urgência, enquanto os artigos subsequentes disciplinam suas modalidades, como a tutela antecipada e a tutela cautelar.
A tutela de evidência encontra-se disciplinada no artigo 311, do CPC.
3. Requisitos para Concessão da Tutela de Urgência.
A obtenção da tutela de urgência demanda a presença de requisitos específicos, cuja ausência inviabiliza sua concessão. Os principais requisitos são:
- Probabilidade do Direito: O requerente deverá apresentar elementos que evidenciem a probabilidade do direito que busca proteger. A análise da verossimilhança das alegações é crucial para a concessão da tutela.
- Perigo de Dano ou Risco ao Resultado Útil do Processo: A urgência decorre da iminência de dano irreparável ou de difícil reparação caso a medida não seja concedida. O perigo de dano deve ser real e não meramente conjectural. Deixou de estar presente o periculum in mora e o fumus boni iuris, no entanto, entendo que esses termos inconscientemente encontram-se englobados nos requisitos apresentados. Ou seja, na probabilidade do direito e no perigo de dano ou do resultado útil do processo.
A tutela de urgência também leva em consideração a possibilidade de reversão da situação caso a medida seja deferida. Agora, se a lesão do autor for irreversível, a concessão da tutela se torna mais premente.
O atual sistema continua vedando como no anterior a concessão de tutela de natureza antecipatória quando existir perigo de irreversibilidade. Se a situação não puder ser desfeita após a concessão, o código vedada a concessão (CPC, artigo 300, § 3º).
Contudo, dependendo da situação, o juiz deverá analisar se a irreversibilidade poderá perecer o direito significativo buscado pelo autor. Ou seja, o Juiz deve analisar se não ocorrerá a irreversibilidade recíproca de direitos, como por exemplo, o perecimento do direito a vida do autor. Tal direito, por certo, torna a pretensão do autor de grande relevância ao ponto de ser deferida a tutela mesmo que exista possibilidade de irreversibilidade da medida.
Neste sentido, temos decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO – TUTELA DE URGÊNCIA – Pretensão de reforma da r. decisão que indeferiu pedido de tutela antecipada – Cabimento – Hipótese em que, em cognição ainda sumária da situação de direito material, a probabilidade do direito alegado e o perigo de dano estão suficientemente demonstrados, de modo a justificar a concessão em primeiro grau da tutela de urgência postulada – Necessidade de relativizar o risco de irreversibilidade, mediante a ponderação dos interesses em conflito – RECURSO PROVIDO”. (TJSP; Agravo de Instrumento 2140628-05.2023.8.26.0000; Relator (a): Ana de Lourdes Coutinho Silva da Fonseca; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional II – Santo Amaro – 1ª Vara Cível; Data do Julgamento: 31/07/2023; Data de Registro: 31/07/2023)
No mesmo sentido, segue decisão do Superior Tribunal de Justiça:
“AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRETENSÃO DE COBERTURA DE INTERNAÇÃO EM ESTABELECIMENTO ADEQUADO PARA TRATAMENTO DE ALZHEIMER. TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EFEITO SUSPENSIVO NEGADO. ALEGADA IRREVERSIBILIDADE DA DECISÃO. PREVALÊNCIA DO DIREITO À SAÚDE. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO DESPROVIDO. 1. In casu, discute-se a concessão de efeito suspensivo a agravo de instrumento interposto contra decisão que deferiu a tutela de urgência, nos autos de ação de obrigação de fazer, para determinar o custeio, pelo plano de saúde, de internação em estabelecimento adequado para tratamento de Alzheimer, inclusive no que diz respeito a medicamentos, fraldas e alimentação através de sonda, se necessário. 2. O Tribunal de origem indeferiu o pedido de efeito suspensivo, mantendo a decisão interlocutória até o julgamento definitivo do recurso pelo colegiado, por entender presentes os requisitos necessários para a concessão da tutela de urgência e, em contrapartida, ausentes os pressupostos para a suspensão dos efeitos do decisum. 3. Segundo o Tribunal a quo, não foi demonstrada a probabilidade do provimento recursal e, considerando o risco de irreversibilidade da medida, deveria ser resguardado o perigo de dano à saúde da autora, em detrimento do risco de prejuízo ao patrimônio da agravante. 4. No caso, a modificação da conclusão do acórdão recorrido, acerca da configuração dos requisitos necessários à concessão do efeito suspensivo ao agravo de instrumento, demandaria o revolvimento de matéria fática, o que é inviável em sede de recurso especial, a teor do que dispõe a Súmula 7 do STJ. 5. Agravo interno a que se nega provimento”. (AgInt no AREsp n. 1.353.002/SC, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 25/6/2019, DJe de 1/7/2019.)
Assim, ainda que exista possibilidade de irreversibilidade, quando o direito do autor for de grande relevância, o pedido de urgência poderá ser deferido. Nestes casos para solução da questão, o juiz deverá aplicar os princípios de direito, para encontrar a solução mais adequada. Os principais exemplos são o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade.
Dependendo da situação, poderá o juiz exigir caução idônea. O caução poderá ser nas modalidades real ou fidejussória. Essa medida tem por objetivo resguardar eventuais danos que a outra parte possa ter. No entanto, se a parte não tiver condições de prestar este caução, poderá ser dispensado pelo juiz o seu oferecimento, ficando a critério do mesmo essa avaliação (CPC, artigo 300, § 1º).
Outra questão que tem relevância, é que a tutela poderá ser concedida liminarmente ou após audiência de justificação. Essa audiência é realizada quando o juiz ainda não se convenceu que estão presentes os requisitos para a concessão da tutela, de modo que o autor no ato poderá fazer prova da presença dos requisitos para que o juiz conceda a tutela pretendida (CPC, artigo 300, § 2º).
4. Tutela Antecipada e Tutela Cautelar: Distinções e Aplicações.
A tutela de urgência se desdobra em duas modalidades: antecipada e cautelar.
A tutela antecipada visa antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da decisão de mérito, acelerando a proteção do direito ameaçado.
Uma vez concedida a tutela, ela se tornará estável se a parte contrária não interpor recurso para reforma da decisão (artigo 304, do CPC).
Extinto o processo em vista da estabilização da decisão, qualquer das partes poderá propor ação para rever, modificar, ou invalidar a tutela concedida. A tutela conserva seus efeitos enquanto não for revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito (artigo 304, §s 2º e 3º, do CPC).
Por fim, o direito de reforma da decisão não é eterno, já que a decisão que concede a tutela não transita automaticamente em julgado. A parte que quiser rever a decisão, terá o prazo decadencial de dois anos para propor a ação para revisão do que foi decidido. (artigo 304, § 5º, do CPC).
Já a tutela cautelar tem caráter preparatório, objetivando resguardar a eficácia do processo principal. As principais medidas cautelares são arresto, sequestro, arrolamento de bens e registo de protesto contra alienação de bem. Ocorre, entretanto, que nossa legislação aceita qualquer outra medida idônea para assegurar o direito do cliente.
Na petição inicial da tutela de urgência cautelar, o Requerente deverá expor a lide e seus fundamentos, demonstrando de forma clara o direito que busca assegurar e o perigo de dano ou risco do resultado útil do processo caso não seja concedido (artigo 305, do CPC).
O Réu nesta ação é citado para contestar no prazo de cinco dias, no entanto, se não fizer, os fatos alegados pelo Autor se presumirão verdadeiros, decidindo o juiz sobre o pedido no prazo de cinco dias. Por outro lado, contestada a ação, o processo tramitará com base no procedimento comum (artigo 306 e 307, do CPC).
Com a efetivação da tutela, o Requerente terá o prazo de 30 dias para apresentar o pedido principal, no mesmo processo, diferentemente do que ocorria na vigência do CPC anterior (artigo 308, do CPC).
Se o Requerente optar, poderá apresentar junto com o pedido inicial, o pedido principal, sendo permitido que a parte altere a causa de pedir até a formulação do pedido principal (artigo 308, § 1º e 2º do CPC).
Realizado o pedido principal, as partes poderão ser intimadas para realização de audiência de conciliação ou mediação. Se nesta audiência não houver composição, o prazo para contestação será contado a partir da data da audiência, conforme dispõe o artigo 334, do CPC.
Perderá a eficácia a medida cautelar concedida se a parte não deduzir o pedido principal no prazo legal, não efetivar o pedido principal no prazo de 30 dias, se o juiz julgar improcedente o pedido principal formulado pelo Requerente ou extinguir o processo sem resolução do mérito.
Perdendo a eficácia a cautelar, é vedada a sua renovação sob o mesmo fundamento. Se for indeferida, a parte tem a possibilidade de renovar o pedido principal, o que não interferirá no seu julgamento, salvo se ocorrer o reconhecimento da decadência ou da prescrição (artigo 309 e 310, do CPC).
5. Da tutela de Evidência.
A tutela de evidência poderá ser concedida, independentemente da demonstração do perigo de dano ou risco do resultado útil do processo quando (artigo 311, do CPC):
I – ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte;
II – as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;
III – se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa;
IV – a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.
O parágrafo único do referido artigo é claro ao mencionar que nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente. Se tratando de fatos e documentos relativos aos incisos I e IV, o juiz somente poderá conceder em sentença a tutela.
6. Tutela de Urgência e Direito Civil.
No âmbito do Direito Civil, a tutela de urgência desempenha um papel fundamental em diversas situações, tais como:
- Contratos: Nas situações de inadimplemento contratual, a tutela de urgência pode ser buscada para evitar prejuízos imediatos, garantindo o adimplemento ou a rescisão do contrato. Caso a parte não reconheça eventual cobrança que tenha gerado apontamento do seu nome nos órgãos de proteção do crédito, poderá se utilizar da cautelar para inibir referida restrição.
- Decadência ou prescrição: Nas situação de decadência e prescrição, poderá a parte evitar a perda do seu direito através da cautelar de protesto. Neste ato estará interrompendo o prazo decadencial ou prescricional, voltando a transcorrer novamente o referido prazo.
- Sequestro: A cautelar de sequestro pode ser utilizada para sequestrar determinado bem que pende litígio entre as partes.
- Arresto: O arresto cautelar por sua vez pode ser utilizado para apreensão de qualquer bem do devedor visando o pagamento de dívida.
- Danos Morais e Materiais: Em casos de violações a direitos da personalidade, a tutela de urgência pode ser buscada para cessar a prática danosa e assegurar a reparação dos danos.
- Família e Sucessões: Nas questões familiares, como casos de violência doméstica, a tutela de urgência é essencial para proteger a integridade física e psicológica dos envolvidos. Pode ser utilizada também para arrolar bens do casal, ou sequestrar eventual bem que se encontrar na posse indevida de um dos cônjuges.
7. Conclusão.
A tutela de urgência, no contexto do Direito Civil e Processo Civil, desempenha um papel vital na preservação dos direitos fundamentais. Sua concessão tem o propósito de garantir a efetividade da jurisdição, prevenindo danos irreparáveis ou de difícil reparação.
A compreensão dos requisitos e modalidades dessa tutela é essencial para que os profissionais do direito possam utilizar essa ferramenta de maneira eficaz em prol da justiça e da equidade.
Diante da dinâmica do mundo jurídico, a tutela de urgência se apresenta como uma resposta eficiente e célere, contribuindo para a eficácia do sistema judiciário e para a proteção dos direitos dos cidadãos.
É imperativo que os operadores do direito estejam atualizados e capacitados para manejar essa importante ferramenta, sempre pautados pela busca da justiça e pela tutela efetiva dos direitos da sociedade.