A Validade de Contratos Digitais e os Desafios Jurídicos na Era da Transformação Digital.
Sumário
Toggle1. Introdução.

A digitalização das relações jurídicas trouxe consigo uma série de avanços e desafios para o Direito brasileiro.
Entre eles, destaca-se a necessidade de garantir a validade e a executividade de contratos eletrônicos, que se tornaram ferramentas essenciais em um mundo cada vez mais conectado.
O julgamento do AgInt no Recurso Especial nº 2163004 – DF pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) é um marco nessa discussão, ao abordar questões cruciais sobre a autenticidade e a presencialidade em contratos celebrados digitalmente.
Neste artigo, analisamos o caso à luz da legislação brasileira e da jurisprudência do STJ, explorando os requisitos necessários para a validade de contratos eletrônicos, os limites da negativa de prestação jurisdicional e a vedação ao reexame de matéria fática.
Além disso, discutimos como a decisão reflete a adaptação do Direito às novas realidades tecnológicas, oferecendo insights valiosos para advogados, empresas e cidadãos que utilizam contratos digitais em suas relações jurídicas.
2. Contexto do Caso.

O caso em questão envolveu a Fundação dos Economiários Federais (FUNCEF), agravante, e Marcilene Rodrigues Baganha Bento, agravada.
A FUNCEF buscou o reconhecimento da executividade de contratos eletrônicos celebrados por meio de uma plataforma online, alegando que os documentos possuíam assinatura digital certificada. No entanto, o Tribunal de origem negou a executividade, entendendo que os meios utilizados não eram sufici
entes para comprovar a autenticidade e a presencialidade do contratante.
A FUNCEF interpôs recurso especial, sustentando que o Tribunal de origem teria incorrido em negativa de prestação jurisdicional ao não reconhecer a validade dos contratos eletrônicos.
O STJ, no entanto, manteve a decisão, destacando a necessidade de instrumentos robustos para garantir a autenticidade dos documentos digitais.
3. A Executividade de Contratos Eletrônicos. Requisitos Legais e Jurisprudenciais para a Validade de Contratos Digitais.

A executividade de contratos eletrônicos é um tema que ganhou relevância com o avanço da transformação digital e a popularização das transações online.
No entanto, para que um contrato eletrônico tenha força executiva, é essencial que ele atenda a requisitos legais e jurisprudenciais específicos, que garantam sua autenticidade, integridade e validade jurídica.
3.1. Fundamentação Legal.
A Lei nº 11.419/2006, que regulamenta a informatização do processo judicial, estabelece em seu artigo 1º, §2º, inciso III, que documentos eletrônicos assinados digitalmente têm validade jurídica, desde que atendam aos requisitos de autenticidade e integridade.
Além disso, a Medida Provisória nº 2.200-2/2001, que instituiu a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil), determina que certificados digitais emitidos por autoridades credenciadas conferem validade jurídica aos documentos eletrônicos.
A ICP-Brasil é um sistema hierárquico de certificação digital que utiliza criptografia assimétrica para garantir a autenticidade e a integridade de documentos eletrônicos. Quando um contrato é assinado com um certificado digital emitido por uma autoridade certificadora credenciada pela ICP-Brasil, presume-se que ele atende aos requisitos legais de autenticidade e presencialidade.
3.2. A Autenticidade e a Presencialidade nos Contratos Eletrônicos.
A autenticidade refere-se à garantia de que o documento foi efetivamente assinado pela parte contratante, enquanto a presencialidade assegura que a assinatura foi realizada de forma consciente e voluntária.
No ambiente digital, esses requisitos são atendidos por meio de certificados digitais, que utilizam criptografia para garantir a integridade e a autenticidade dos documentos.
No caso analisado pelo STJ, a FUNCEF alegou que os contratos eletrônicos em questão possuíam assinatura digital certificada por meio de um selo da plataforma “Comprova.com”.
No entanto, o Tribunal de origem entendeu que esse selo não era suficiente para comprovar a autenticidade e a presencialidade, uma vez que não havia informações claras sobre a identidade do signatário ou a forma como a assinatura foi realizada.
O STJ reforçou que, embora seja possível reconhecer a executividade de contratos eletrônicos, é essencial que as partes adotem instrumentos robustos para garantir a autenticidade e a presencialidade.
No caso concreto, a ausência de um certificado digital emitido pela ICP-Brasil ou de outros meios igualmente confiáveis foi determinante para o não reconhecimento da executividade dos contratos.
3.3. A Jurisprudência do STJ sobre Contratos Eletrônicos.
O STJ já se posicionou em diversos casos sobre a executividade de contratos eletrônicos, consolidando entendimentos importantes sobre o tema.
No REsp nº 1.495.920/DF, por exemplo, o Tribunal reconheceu a possibilidade de execução de contratos eletrônicos assinados digitalmente, desde que adotados instrumentos capazes de verificar a autenticidade e a presencialidade do contratante.
Nesse julgado, o STJ destacou que a assinatura digital tem a vocação de certificar, por meio de um terceiro desinteressado (autoridade certificadora), que determinado usuário utilizou a assinatura de forma consciente e voluntária.
Dessa forma, quando esses requisitos são atendidos, é possível reconhecer a executividade do contrato, mesmo que ele não tenha sido assinado na presença de testemunhas.
No entanto, o STJ também ressaltou que o reconhecimento da executividade de contratos eletrônicos depende da comprovação robusta da autenticidade e da presencialidade.
No caso do AgInt no Recurso Especial nº 2163004 – DF, a ausência de um certificado digital emitido pela ICP-Brasil ou de outros meios igualmente confiáveis foi determinante para o não reconhecimento da executividade dos contratos.
3.4. A Importância da Segurança Jurídica nas Transações Digitais.
A segurança jurídica é um princípio fundamental do Direito, especialmente em um contexto de transformação digital.
Para que os contratos eletrônicos sejam amplamente utilizados e reconhecidos, é essencial que as partes tenham confiança na validade e na executividade desses documentos.
A adoção de instrumentos robustos, como certificados digitais emitidos pela ICP-Brasil, é fundamental para garantir a autenticidade e a presencialidade dos contratos eletrônicos. Além disso, a jurisprudência do STJ tem desempenhado um papel importante na consolidação de entendimentos sobre o tema, oferecendo diretrizes claras para a validade e a executividade desses documentos.
A executividade de contratos eletrônicos é um tema complexo, que exige a combinação de instrumentos tecnológicos robustos e fundamentação jurídica sólida.
A legislação brasileira, representada pela Lei nº 11.419/2006 e pela MP nº 2.200-2/2001, estabelece as bases para a validade desses documentos, enquanto a jurisprudência do STJ oferece diretrizes claras sobre os requisitos necessários para sua executividade.
No caso analisado, a ausência de um certificado digital emitido pela ICP-Brasil ou de outros meios igualmente confiáveis foi determinante para o não reconhecimento da executividade dos contratos.
Esse entendimento reforça a importância de adotar práticas seguras e alinhadas às inovações tecnológicas, garantindo a validade e a executividade dos contratos eletrônicos no Brasil.
4. A Negativa de Prestação Jurisdicional.

A FUNCEF alegou que o Tribunal de origem teria incorrido em negativa de prestação jurisdicional ao não reconhecer a validade dos contratos eletrônicos.
No entanto, o STJ rejeitou esse argumento, com base no artigo 489 do Código de Processo Civil (CPC/2015), que estabelece que a decisão judicial deve ser fundamentada, mas não precisa abordar todos os argumentos apresentados pelas partes, desde que solucione a controvérsia de forma adequada.
O STJ destacou que o Tribunal de origem enfrentou todas as questões relevantes do caso, concluindo que os meios empregados pela FUNCEF não eram suficientes para comprovar a autenticidade dos contratos. Dessa forma, não houve omissão ou negativa de prestação jurisdicional, mas sim uma decisão contrária aos interesses da parte recorrente.
5. A Vedação ao Reexame de Matéria Fática.

Outro ponto relevante do julgamento foi a aplicação da Súmula nº 7/STJ, que veda o reexame de matéria fática em recursos especiais. O STJ destacou que, para reconhecer a executividade dos contratos eletrônicos, seria necessário reanalisar o contexto fático-probatório dos autos, o que é vedado na via recursal eleita.
Essa vedação é essencial para garantir a segurança jurídica e a efetividade do processo, evitando que recursos especiais sejam utilizados para rediscutir questões de fato já decididas pelos tribunais de origem.
6. Conclusão.

O julgamento do AgInt no Recurso Especial nº 2163004 – DF pelo STJ reforça a importância de instrumentos robustos e confiáveis para garantir a validade e a executividade de contratos eletrônicos.
A decisão demonstra que, embora a legislação brasileira reconheça a validade jurídica desses documentos, é imprescindível que as partes adotem medidas capazes de comprovar a autenticidade e a presencialidade, como certificados digitais emitidos pela ICP-Brasil ou outros meios tecnológicos igualmente seguros.
Além disso, o caso serve como um alerta para a necessidade de fundamentação adequada das decisões judiciais, sem que isso implique a obrigação de enfrentar todos os argumentos apresentados pelas partes.
A aplicação da Súmula nº 7/STJ, que veda o reexame de matéria fática em recursos especiais, também reforça a importância de uma análise cuidadosa das provas nos tribunais de origem, garantindo segurança jurídica e efetividade ao processo.
Em um mundo cada vez mais digital, decisões como essa são fundamentais para orientar a prática jurídica e garantir que as relações contratuais eletrônicas sejam seguras, válidas e executáveis.
A adaptação do Direito às novas tecnologias não apenas fortalece a confiança nas transações digitais, mas também consolida o Brasil como um ambiente jurídico moderno e preparado para os desafios da era digital.
Este artigo demonstra como o Direito brasileiro tem evoluído para acompanhar as transformações tecnológicas, garantindo segurança jurídica nas relações digitais.
A análise do caso em questão serve de guia para advogados, empresas e cidadãos que utilizam contratos eletrônicos, destacando a importância de adotar medidas robustas para garantir sua validade e executividade.