Sumário
Toggle1. Introdução: A Relevância da Socioafetividade e os Desafios da Paternidade Responsável.

A desconstituição da paternidade é um tema que desafia as tradicionais noções de família e parentesco no Direito brasileiro, especialmente em um contexto em que os laços afetivos e sociais ganham cada vez mais relevância frente ao vínculo meramente biológico.
Recentemente, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), proferiu decisão importante ao manter a desconstituição da paternidade de um jovem que alegou abandono afetivo e material por parte de seu pai registral.
O caso não apenas reforça o princípio da socioafetividade como base para as relações familiares, mas também evidencia a importância do cumprimento dos deveres inerentes à paternidade responsável, previstos na Constituição Federal e no Código Civil.
Este julgamento traz à tona uma discussão fundamental: até que ponto a ausência de um vínculo afetivo pode justificar o rompimento de um laço jurídico de paternidade?
A decisão do STJ, fundamentada no abandono material e afetivo sofrido pelo filho, demonstra que o Direito brasileiro está atento às transformações sociais e às novas dinâmicas familiares, priorizando a proteção dos vínculos construídos com base no afeto e no cuidado mútuo.
Neste artigo, exploraremos os aspectos jurídicos do caso, analisando como a socioafetividade e o princípio da paternidade responsável foram aplicados para fundamentar a desconstituição da paternidade.
2. O Princípio da Socioafetividade no Direito de Família.

A socioafetividade tem ganhado cada vez mais relevância no Direito de Família brasileiro, sendo reconhecida como um dos pilares fundamentais para a constituição e manutenção dos vínculos familiares.
De acordo com a ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, “se a presença de socioafetividade autoriza o reconhecimento de vínculo de filiação, é possível compreender que a sua ausência implicaria o seu rompimento”.
Esse entendimento está alinhado com o princípio da afetividade, que considera os laços emocionais e de convivência como elementos essenciais para a configuração das relações familiares.
No caso em questão, o STJ entendeu que a ausência de socioafetividade entre o pai e o filho justificava a desconstituição da paternidade, uma vez que o genitor registral não cumpriu com seus deveres de cuidado e assistência.
3. A Paternidade Responsável e os Deveres dos Genitores.

A Constituição Federal de 1988 estabelece, em seus artigos 227 a 229, os deveres da família, especialmente no que diz respeito à proteção e ao cuidado dos filhos.
O artigo 227, por exemplo, determina que “é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária”.
No caso analisado pelo STJ, o pai registral não cumpriu com esses deveres, abandonando o filho tanto material quanto afetivamente. A ministra Nancy Andrighi destacou que “a ausência de socioafetividade estabelecida ao longo de 25 anos demonstra a quebra dos deveres de cuidado do genitor para com o filho, ensejando seu abandono material e afetivo”.
4. A Desconstituição da Paternidade e o Abandono Afetivo.

A desconstituição da paternidade é um mecanismo jurídico que permite o rompimento do vínculo de filiação quando comprovada a inexistência de vínculo biológico ou socioafetivo.
No caso em questão, o rapaz alegou que sofreu abandono afetivo e material por parte de seu pai, além de ter sido estigmatizado devido a um crime cometido por ele. Esses fatos levaram o jovem a buscar a desconstituição da paternidade, a fim de que seu registro de nascimento fosse alterado para constar apenas os nomes de sua mãe e avós maternos.
O STJ entendeu que o abandono afetivo e material configuram descumprimento do princípio da paternidade responsável, previsto na Constituição Federal.
A ministra relatora ressaltou que “o cometimento do crime, por si só, não acarretaria o rompimento da filiação, mas a ausência de socioafetividade estabelecida ao longo de 25 anos demonstra a quebra dos deveres de cuidado do genitor para com o filho”.
5. A Importância do Vínculo de Socioafetividade.

O vínculo de socioafetividade é um dos pilares do Direito de Família contemporâneo, sendo reconhecido como fonte de parentesco tanto quanto o vínculo biológico.
No caso em análise, o STJ destacou que a ausência desse vínculo justificava a desconstituição da paternidade, uma vez que o pai registral não estabeleceu uma relação de afeto e cuidado com o filho.
Esse entendimento está em consonância com o artigo 1.593 do Código Civil, que estabelece que “o parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem”.
A socioafetividade, portanto, é considerada uma “outra origem” de parentesco, podendo ser utilizada tanto para o reconhecimento quanto para a desconstituição de vínculos familiares.
6. Conclusão.

O caso julgado pela Terceira Turma do STJ reforça a importância do vínculo de socioafetividade no Direito de Família brasileiro, destacando que a paternidade não se resume ao mero vínculo biológico, mas envolve também o cumprimento de deveres de cuidado e assistência.
A decisão demonstra que a ausência de socioafetividade e o descumprimento dos deveres de paternidade responsável podem levar à desconstituição da paternidade, conforme previsto na legislação brasileira.
A desconstituição da paternidade, nesse contexto, não é apenas uma questão jurídica, mas também uma forma de garantir a proteção dos direitos e da dignidade daqueles que foram abandonados afetiva e materialmente por seus genitores.
O STJ, ao manter a decisão de desconstituição da paternidade, reafirma o compromisso do Direito brasileiro com a proteção dos vínculos familiares baseados no afeto e no cuidado mútuo.
Processo em segredo de justiça.