A empresa Ingredion Brasil Ingredientes Industriais Ltda., sediada em Mogi Guaçu, São Paulo, recentemente teve seu recurso negado em uma ação judicial que buscava a anulação de um auto de infração lavrado pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB).
A ação girava em torno de uma multa de R$ 414.150,00, aplicada à empresa após a CETESB identificar o lançamento de efluentes poluentes no Rio Mogi Guaçu, o que teria causado a morte de peixes e a contaminação do rio.
O início da disputa ocorreu após a CETESB receber denúncias de mortandade de peixes no Rio Mogi Guaçu em 30 de setembro de 2018. Após essa denúncia, uma equipe de fiscalização da CETESB se deslocou até a fábrica da Ingredion no dia 1º de outubro de 2018, onde identificou um vazamento de efluentes brutos, ou seja, sem o devido tratamento, que estavam sendo lançados diretamente no rio. Segundo o relatório, esse vazamento se deu por uma falha na parede de uma canaleta que conduzia os efluentes tratados.
A fiscalização foi intensificada e diversos testes de qualidade da água, como medição de pH e temperatura, indicaram a presença de poluentes fora dos padrões permitidos. Amostras de água e dos peixes afetados foram recolhidas para análise, e os resultados indicaram uma provável relação entre os efluentes lançados pela empresa e a mortandade dos peixes.
Em razão dos danos ambientais constatados, a CETESB lavrou o Auto de Infração n.º 65000881, que resultou na imposição de uma multa de 15.000 UFESPs, totalizando R$ 414.150,00. A penalidade foi aplicada com base no Decreto Estadual n.º 8468/76, que regulamenta a Lei Estadual n.º 997/76, dispositivos que regulamentam o controle de poluição ambiental no Estado de São Paulo.
https://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/decreto/1976/decreto-8468-08.09.1976.html
https://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei/1976/compilacao-lei-997-31.05.1976.html
A Ingredion, por sua vez, contestou a autuação e ingressou com uma ação anulatória visando a nulidade do Auto de Infração. Na ação, a empresa alegou que não havia provas de que os efluentes lançados teriam causado a contaminação do rio e a morte dos peixes. A empresa também sustentou que a CETESB não teria estabelecido de forma clara o nexo de causalidade entre o lançamento dos seus efluentes e os danos ambientais relatados.
Além disso, a Ingredion argumentou que o lançamento de efluentes tratados estava devidamente licenciado e segundo os padrões exigidos pela legislação ambiental vigente. A empresa também ressaltou que, desde a emissão da Licença de Operação, vinha tomando todas as medidas necessárias para evitar a poluição ambiental, incluindo a modernização de sua Estação de Tratamento de Efluentes (ETE).
No decorrer da ação, foi determinada a realização de uma perícia técnica para apurar os fatos. O laudo pericial, bastante detalhado, confirmou a ocorrência de dois tipos de efluentes sendo lançados no Rio Mogi Guaçu: o efluente tratado, que estava dentro dos padrões legais, e o efluente bruto, fruto do vazamento na canaleta.
A perícia também indicou que, embora fosse possível a presença de outras causas para a contaminação da água e a morte dos peixes, a principal fonte de poluição naquele trecho do rio era o lançamento irregular de efluentes brutos pela Ingredion.
O laudo técnico foi conclusivo ao apontar que, mesmo que não fosse possível atribuir a totalidade do dano à empresa, a poluição detectada foi acima dos padrões legais permitidos, o que justifica a autuação da CETESB.
Ainda que tenha ressaltado a impossibilidade de atribuir diretamente à empresa toda a responsabilidade pela mortandade dos peixes, a perícia afirmou que a contaminação da água ocorreu em concentrações superiores às permitidas e que a poluição por efluentes da Ingredion teve papel significativo no evento.
A decisão de primeira instância foi desfavorável à Ingredion, sendo julgada improcedente a ação anulatória. O juízo entendeu que, embora a mortandade dos peixes pudesse ter outras causas concorrentes, a atuação da empresa foi determinante para a poluição do rio.
A sentença destacou que a responsabilidade da empresa decorre de sua obrigação de monitorar constantemente o tratamento de seus efluentes, evitando qualquer possibilidade de vazamento de substâncias poluentes.
Na sentença, o magistrado ressaltou que “a dúvida acerca da mortandade resolve-se em prol do meio ambiente”, aplicando o princípio “in dubio pro natura”, que determina que, em casos de dúvida, deve-se decidir em favor da proteção ambiental.
Além disso, foi destacado que “a única atividade poluidora na área era produzida pela apelante”, confirmando que a Ingredion foi a principal responsável pela contaminação do trecho do Rio Mogi Guaçu.
Inconformada com a sentença, a Ingredion interpôs recurso de apelação, alegando novamente a inexistência de nexo causal entre suas atividades e os danos ambientais e pleiteando a anulação do Auto de Infração. A empresa também pediu a suspensão da multa imposta, argumentando que as provas periciais não eram conclusivas sobre a sua responsabilidade.
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), no entanto, manteve a sentença de primeira instância. O colegiado considerou que as provas colhidas, especialmente o laudo pericial, eram suficientes para comprovar a infração cometida pela empresa.
O acórdão também reafirmou a importância da responsabilidade da empresa em garantir o controle de suas atividades e o respeito aos padrões de lançamento de efluentes.
Além de negar provimento ao recurso, o TJSP aumentou os honorários advocatícios devidos pela Ingredion para 15% do valor corrigido da causa.
O caso envolvendo a Ingredion e a CETESB reflete a complexidade das questões ambientais e a responsabilidade das empresas no controle de suas atividades.
O julgamento reforça a posição da Justiça e dos órgãos ambientais na proteção rigorosa dos recursos hídricos e da fauna, aplicando penalidades severas às empresas que, por ação ou omissão, permitam que suas atividades prejudiquem o meio ambiente.
A decisão também reafirma a aplicação do princípio poluidor-pagador, que estabelece que o responsável por causar danos ambientais deve arcar com os custos de reparação.
Em um contexto de crescente preocupação com o meio ambiente, essa decisão serve como um alerta para outras empresas que operam em áreas sensíveis, demonstrando que a negligência no controle de efluentes pode resultar em pesadas sanções.